Jacques-Alain Miller com Jorge Forbes

ENTREVISTA DO MOMENTO ATUAL

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Esta entrevista teve início em Paris, segunda-feira 13 de outubro de 2008, no dia seguinte às Jornadas da Escola da Causa freudiana, realizadas no Palais des Congrès. As Jornadas foram encerradas como de costume por Jacques-Alain Miller, que havia proposto como tema para o ano que vem: “Como se tornar psicanalista no início do século XXI”.

Jorge Forbes: Escutando sua intervenção de domingo sobre o tema das próximas Jornadas, pensei que você se referia aos CPCTs, sem nomeá-los. É fato? (CPCT: Centre Psychanalytique de Consultations et de traitement)

Jacques-Alain Miller: É e não é. É: na medida em que essa experiência é um sucesso, e que é útil a certo número de analistas em formação; trata-se de fazê-la perdurar e de aperfeiçoá-la. E não é, porque os CPCTs não são a única criação do Campo freudiano a se dedicar à psicanálise aplicada. Mas, sobretudo, o problema é muito mais amplo, diz respeito à incompatibilidade do discurso do analista com o discurso do mestre.

Assim mesmo você fez críticas precisas ao fenômeno CPCT: que a psicanálise aplicada não é a via real da psicanálise; que nós temos nos deixado seduzir pela sociedade; que há aí defesa grupal, o que me leva a pensar no « mutualismo » que você denunciou no Brasil há dez anos atrás; etc.

A questão é, primeiro, quantitativa, “econômica” no sentido freudiano. Há uma imensa bomba de sugar libido ligada permanentemente no Campo freudiano, e que, de cinco anos para cá, está sugando tudo quanto pode. Dá para entender que isso acaba criando distorções.

Desde quando você vê as coisas dessa maneira?

O momento de ver? Foi por ocasião de uma Conferência institucional convocada em Paris, em meados de setembro, e o momento de concluir chegou nesse fim de semana.

E o que exatamente você concluiu?

Que não era mais possível continuar tendo uma Escola na qual o passe vai se esvaecendo, murchando, cujo sangue parece ter sido sugado por um vampiro, enquanto que, simultaneamente, o efeito terapêutico está sendo levado aos píncaros. Isso numa Escola lacaniana. É estapafúrdio, é o mundo de cabeça para baixo.


Como você explica isso?
Para apreender o porquê e o como, será preciso refazer, se posso assim dizer, uma segunda rodada de tempo lógico – mas desta vez, coletiva. Vou começar logo domingo que vem, em Bordeaux, onde Philippe La Sagna me convidou, para uma Conversação no CPCT. O que nos ocorreu? Onde foi que bobeamos, para falar em português claro?

Mas você já tem uma idéia, te conheço...

Tenho várias idéias, mas ainda gerais, gerais demais. Antes de operar, de retificar, deve-se colher um monte de informações, de detalhes, de “pequenos fatos verdadeiros”, como eu fazia outrora quando estava criando as Escolas do Campo freudiano. Acontece, a verdade é essa, que eu não conheço suficientemente a Escola da Causa freudiana de hoje e todos os que gravitam em volta dela.


(Continua.)